Carta Aberta ao Supremo Tribunal Federal

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Pelas Mulheres do Espíritas à Esquerda

Excelentíssima Ministra e Excelentíssimos Ministros do Supremo Tribunal Federal,

Nós, mulheres do coletivo Espíritas à Esquerda de todo o Brasil, dirigimo-nos a esta Corte com respeito e firmeza para manifestar nossa posição diante da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1141, proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que trata da interrupção da gestação em casos de estupro após 22 semanas.

Rejeitamos veementemente a tentativa de entidades religiosas, como a Federação Espírita Brasileira (FEB) e a Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas (ABRAME), de se apresentarem como representantes da totalidade do movimento espírita brasileiro neste processo. A FEB e a ABRAME não representam a pluralidade de pensamentos, práticas e compromissos sociais que compõem o espiritismo no Brasil. Portanto, não têm legitimidade para falar em nome dos espíritas. O Espíritas à Esquerda tem denunciado publicamente o distanciamento dessas entidades em relação às pautas de justiça social, gênero e direitos reprodutivos.

Somos a maioria. O CEBRAP publicou estudo com diversas pesquisas eleitorais de segundo turno agregadas, mostrando o posicionamento político de cada tipo de credo. E, não surpreendentemente, são os espíritas os que mais rejeitam o conservadorismo da extrema-direita. Somos 67,7%, ou seja, de cada 3 espíritas, 2 declararam voto no presidente Luiz Inácio Lula da Silva, enquanto apenas 27% declararam voto no então candidato da extrema-direita. Esses dados revelam que a maioria dos espíritas brasileiros compartilha valores progressistas, democráticos e comprometidos com os direitos humanos —e não se reconhece nas vozes conservadoras e reacionárias que tentam se impor como porta-vozes do movimento espírita.

Além disso, acrescentamos que, desde 2022, as mulheres do coletivo Espíritas à Esquerda, elaboraram o Manifesto pelo direito de decidir, apresentado e aprovado na plenária do II Encontro Nacional da Esquerda Espírita (ENEE), realizado em 10 de julho de 2022 na sede do Sindicato dos Bancários do Estado de São Paulo. A íntegra do documento está disponível na página do coletivo Espíritas à Esquerda. Nesse sentido, não podemos retroceder!

Reafirmamos que:

  • O livre-arbítrio é um princípio espiritual inalienável. Cabe a cada espírito, em sua jornada evolutiva, tomar decisões éticas e conscientes. Portanto, impor restrições à autonomia das mulheres é violar esse princípio fundamental;
  • A verdadeira caridade não se expressa por meio da coerção, mas do acolhimento. Julgar e punir mulheres que enfrentam gestações resultantes de violência sexual é incompatível com a proposta espírita; e
  • A laicidade do estado é uma conquista civilizatória. O espiritismo, como filosofia espiritualista e adogmática, deve preservar sua liberdade de pensamento e jamais se prestar a impor normas religiosas sobre os corpos e as escolhas alheias.

Por isso, solicitamos respeitosamente a esta Corte que não aceite a participação das entidades solicitantes como representantes do espiritismo brasileiro. Porque elas não o são. Elas não falam pela maioria dos espíritas. Porque nós, espíritas progressistas, reconhecemos o direito exclusivo da mulher sobre seu corpo e entendemos que qualquer decisão sobre sua gestação é de sua única e inteira responsabilidade.

A vida da mulher —em sua integralidade física, emocional, psíquica e espiritual— deve ser respeitada como digna e inviolável. Que esta Suprema Corte, guardiã da Constituição e dos direitos fundamentais, escute também as vozes da espiritualidade que acolhe, que liberta e que caminha com o tempo.

Mulheres do Espíritas à Esquerda

Coordenação do Coletivo Espíritas à Esquerda

 

Referências:

1 COMENTÁRIO

  1. Esse é um importante esclarecimento ao STF e à sociedade brasileira: a maioria das pessoas que se declaram espíritas são progressistas! Que “as vozes da espiritualidade que acolhe, liberta e caminha com o tempo” sejam ouvidas, pois o livre arbítrio das mulheres deve ser respeitado e qualquer decisão sua deve ser sua única e inteira responsabilidade. A FEB e a ABRAME não nos representam!

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