Quando se fala na proposta libertadora de Jesus, deve-se colocá-la dentro do contexto em que ela foi anunciada, conforme se pode ler nos textos neotestamentários.
Para melhor compreender a proposta da liberdade que se conquista a partir do conhecimento da verdade, é preciso buscar o fulcro do anúncio trazido por Jesus. Ao anunciar a verdade, o que propôs aquele homem há dois mil anos? O que se pode esperar a partir desse anúncio feito em meio a pobres, famélicos e deserdados?
A alma da mensagem trazida por Jesus pode ser resumida pelo anúncio do “Reino”. O “Reino”, que não é desse mundo de miséria, exploração, opressão e injustiça, é o que move todos os discursos e ações feitos naquele cenário palestino de pobreza e desigualdade.
E esse anúncio traz consigo, como um bom professor o faria, a motivação e os caminhos para a consecução desse “Reino” entre nós. Essa nova sociedade anunciada –porque “evangelho” é justamente o anúncio, a mensagem, a novidade– seria então um espaço de prática de justiça social e fraternidade, onde todos teriam o necessário e ninguém teria em excesso, onde a justiça reinaria e a mansidão se faria sua herdeira. Assim foi anunciado naquele momento em que ele subiu ao monte para falar.
E esse é o ponto em que se pode então compreender a proposta da libertação trazida por aquele homem profundo e sábio: a libertação de todos a partir da transformação da realidade social que é responsável pela opressão e pela exploração do homem pelo homem. E só o fim desse sistema opressivo será capaz de efetivamente trazer a liberdade anunciada nos seus ensinos.
A transformação da realidade social de opressora e exploradora para justa e fraterna é a libertação do homem. De todos os homens. E essa libertação só se efetivará a partir da tomada de consciência do oprimido e explorado do seu lugar nessa estrutura social que o impõe a subserviência e a iniquidade. Só a conscientização daquele que sofre as consequências cruéis da opressão, que se podem traduzir em fome, ignorância, doença e indignidade, será capaz de transformar a realidade, pois essa mudança jamais ocorrerá a partir daquele que oprime.
E a libertação do oprimido, por meio da superação da sua alienação social, é a condição para a libertação do opressor, que também se encontra, muitas vezes, alienado da sua condição de explorador. Assim, apenas por meio da conscientização do oprimido se é capaz de libertar todos os homens e mudar as estruturas que os reduzem a meras engrenagens produtivas.
Por isso a mensagem de libertação de Jesus é dada aos pobres e desgraçados do mundo, pois é deles, e apenas deles, o papel revolucionário da conquista do “Reino”.
Em sua tarefa iluminada, o homem Jesus dedicou seus momentos proféticos a falar com essa gente, a retirar dela o véu da ignorância que aliena as consciências submissas e conscientizá-las da sua árdua tarefa de lutas e mudanças, que seriam então traduzidas numa nova realidade, num novo “Reino” que não é desse mundo de dores, injustiças e opressão.
Os espíritas, como seguidores dessa mensagem e aliados dessa proposta de transformação radical das estruturas que exploram e oprimem, devem-se sentir motivados a lutar pela implantação desse “Reino”, fazendo um pouco aquilo que o ilustrado professor há dois mil anos fez com tanto brilho: colocar-se como instrumento e ferramenta para conscientizar e libertar aqueles que são as vítimas desse mundo velho que insiste em fazer morada entre os homens.
Não há caminho possível, e essa é a mensagem profunda e libertadora de Jesus, para a transformação humana que não seja por meio do trabalho, ao mesmo tempo miúdo e extenso, na luta pela conscientização do oprimido. Não, não há outro caminho, e é apenas nele que os espíritas e suas instituições deveriam atuar como seguidores dessa mensagem, preparando-se da melhor forma para essa tarefa libertadora.