O médium Chico Xavier merece nosso profundo respeito, como de resto todas as pessoas que dedicam sua vida ao auxílio ao próximo, como são também exemplos Dulce Maria, tornada santa pela Igreja Católica, e o médium Zélio Fernandino, fundador da umbanda. E não se pretende nesse breve texto discutir as relações e diferenças entre ação de promoção social e ação assistencialista, que muito bem caberia, mas não é o objetivo.
Feitas as ressalvas iniciais, o que se pretende unicamente é discutir um aspecto curioso da parte do movimento espírita vinculada à sacralização do médium Chico Xavier, o que acabou por dar origem a um neologismo recorrente: o chiquismo. Cabe ressaltar que em nenhuma hipótese se pretende fazer o movimento inverso: o da sacralização de Kardec, pois se entende que sua obra é passível de análise e críticas como a de qualquer outro autor e nela não há verdades incontestes, mas propostas para a transformação do mundo e do ser humano.
É preciso, portanto, para uma análise tranquila e objetiva, distinguir a extensa obra produzida pelo famoso médium mineiro de suas características humanas. Chico, à revelia de seus idólatras, era um homem com virtudes e defeitos, como o são todas as demais pessoas que viveram ou ainda vivem a experiência corporal nesse planeta. E isso tem que estar claro porque o que se pretende é apontar para um desvio de percurso perigoso do movimento espírita, que é a ideia de associar a personalidade de Chico Xavier ao fundador do espiritismo, o lionês Allan Kardec. Esse desvio imenso e arriscado quer fazer, de todas as formas, coincidir os dois espíritos como se fossem um só, ou seja, a ideia bizarra de que Chico Xavier seria a reencarnação de Allan Kardec.
O desejo de impor essa insensata narrativa é tamanho que teve médium sugerindo ser o casamento entre Denisard Hypolite[1] e Amélie Gabrielle um mero conviver de dois amigos, sugerindo uma relação assexuada do casal visando a aproximar as escolhas da vida privada de Kardec às de Chico. Para isso, a esdrúxula ilação usou de três “provas”: a) o fato de ser Amélie nove anos mais velha que Denisard; b) que ela teria por ele um amor maternal e não o amor por um homem; e c) que o casal não teve filhos.
Afora o fato de que é o próprio Allan Kardec, em sua obra “O livro dos médiuns”[2], quem sugere a deturpação filosófica daqueles que endeusam médiuns e demais líderes espíritas, a razão, por si só, bastaria para perceber o desvio crasso daqueles que escolhem esse caminho que inexoravelmente leva ao abismo da irracionalidade mística, da religiosidade piegas e da idolatria improfícua.
Poder-se-ia iniciar o texto fazendo uma extensa análise das diferenças profundas entre as duas personalidades, o que marcaria de forma explícita a impossibilidade da reencarnação do homem racional e cuidadoso com as questões científicas num homem místico e com exacerbadas propensões religiosas. Mas o que se pretende é explorar algo ainda mais grave que subjaz à intencionalidade dessa esdrúxula hipótese: a tentativa vã de igualar a importância, junto ao movimento espírita, da obra mediúnica de Chico Xavier e da obra produzida pelo educador e pesquisador Denisard.
A obra mediúnica de Chico Xavier tem produções muito interessantes e outras ruins. E há outras advindas da sua mediunidade que são lamentáveis, como são exemplos a obra “Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho”, atribuída ao espírito Humberto de Campos, e a obra “Desobsessão”, atribuída ao um espírito que a assina como André Luiz.
O livro “Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho”, datado de 1938, época da ditadura Vargas, período histórico conhecido como Estado Novo, além de deturpar a história brasileira, traz a histeria anticomunista e perigosamente fascista da época em que se vivia. E a exaltação reiterada a essa péssima obra nos tempos atuais apenas ilustra seu papel de anteparo político-doutrinário, à direita espírita, a que sempre se prestou desde sua primeira edição, no final da década de 1930, como ilustra o trecho abaixo:
“Nesta época de confusão e amargura, quando, com as mais justas razões, se tem, por toda parte, a triste organização do homem econômico da filosofia marxista, que vem destruir todo o patrimônio de tradições dos que lutaram e sofreram no pretérito da humanidade, as medidas de repressão e de segurança devem ser tomadas a bem das coletividades e das instituições, a fim de que uma onda inconsciente de destruição e morticínio não elimine o altar de esperanças da pátria. Que o capitalismo, visando à própria tranquilidade coletiva, seja chamado pelas administrações ao debate, a incentivar com os seus largos recursos a campanha do livro, do saneamento e do trabalho, em favor da concórdia universal.”[3]
É preciso, portanto, destacar e denunciar que a intenção não verbalizada de classificar a obra mediúnica do médium de Pedro Leopoldo como complementar à obra de Kardec e, mais, como inaceitável continuidade da elaboração doutrinária do espiritismo, não passa de ardil para justificação, como se tem visto amiúde, de mensagens políticas esdrúxulas e incompatíveis com as verdadeiras propostas espíritas legadas pelos espíritos que auxiliaram Kardec.
A insistência nesse tema por alguns médiuns, palestrantes e dirigentes é proposital. Porque se pode facilmente perceber que todos esses modernos propagadores dessa estranha hipótese apoiaram ou apoiam a degradação moral e cognitiva, conhecida como bolsonarismo, que se entranhou como uma doença no movimento espírita, tornando-o uma proposta místico-religiosa que prega o anticientificismo e apela à irracionalidade fideísta como caminho da prática espírita e como proposta de atuação política do adepto do bolsoespiritismo.
Não é pueril ou desinteressada essa associação entre os espíritos de Kardec e de Chico Xavier. À revelia dos méritos pessoais de cada um, as obras de Chico e de Kardec são díspares, opostas, e não é possível considerá-las complementares, a não ser, claro, que haja a intenção, que é o caso, de se usar a obra do médium mineiro como nova e estranha referência doutrinária do espiritismo para justificar opções políticas protofascistas.
Notas:
[1] Grafia original do nome de Kardec encontrada em sua certidão de nascimento.
[2] KARDEC, Allan. O livro dos médiuns. Brasília, DF: FEB, 2020. p.244.
[3] XAVIER, Francisco C. Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1938. p.167-168.
Por estas e outras como espirita por convicção neste grupo encontrei minha verdadeira identificação.
Explicação até interessante, agora embutir mesmo que rapidamente no texto política e associar um movimento de nome bolsonarismo , ave Maria… o que tem haver ?? Religião é uma crença tão particular de cada pessoa e povo, que chega a ser leviano a associação a uma determinada pessoa ou pessoas por apoiarem X ou Y pessoa na política, a fé e sua conduta como pessoa e suas escolhas, no caso aqui religiosa são até então imparciais… é até desreitoso para com os catolicos e evangélicos tais associações, que tem quem seja simpatizante de um ou outro clã mencionado de nome no caso aqui bolsonarismo, que digamos de passagem que petismo se associa a magia negra, quimbanda, bruxaria e etc … é legal fazer uma associação dessas de maneira generalizada ??
O que ocorre de errado na obra Desobsessao de André Luiz?
Sim, também fiquei curioso.
qdo. me referi, no grupo de estudos, ao livro “brasil, …” e comentando, exatamente, na parte em destaque no presente artigo quase perdi a pele…
Excelente reflexão. Tenho 25 anos, pelo menos 10 de espiritismo, e sempre me incomodou a OBRIGAÇÃO de ler e saber todas as obras de Chico Xavier, principalmente as atribuídas a André Luiz, as ditas obras “completamentares”. Honestamente, ler Paulo Freire, pra mim e na minha opinião, se mostrou muito mais “edificante”, como gostam de dizer.
Sobre o artigo, eu fiquei muito interessada em ler mais sobre dois pontos pincelados no texto: a diferença entre promoção social e ação assistencialista e o que há de errado (não sei se esse seria o termo) na obra Desobsessão (nunca li).
Novamente, parabéns pelo artigo.
Concordo com quase tudo que foi escrito, principalmente o perigo do bolsoespiritismo. Contudo, em primeiro lugar, não se pode falar em “obra” de Chico Xavier, como se fala da obra de Kardec, pois Chico era um médium, quer dizer, um intermediário do que os diversos espíritos ditavam a ele. Em segundo lugar, praticamente “jogar fora” mais de 400 obras, entre as quais boa parte de cunho evangélico, por conta de trechos de duas obras, que de fato podem ser incorretas, é “jogar a criança junto com a água da banheira”. Dizer que as “obras” de Chico são complementares ou não a Kardec, entendo ser irrelevante. Negar a importância das obras consoladoras, baseadas nos ensinos de Jesus, não acho que é o melhor caminho pra reflexão.
Gostei do seu apontamento. Há tanta teoria e problematização, e tão pouca prática do evangelho de Jesus. Nas obras de Chico, o que me interessa, assim como nas de Kardec, é o ensinamento evangélico de Jesus.
Concordo com você
Quando entrei no Espiritismo acabei pelo viés da chamada “direita”. Li o livro Brasil Coração do Mundo, Pátria Do Evangelho e estranhei trechos como estes e outros. Inclusive trechos imprecisos sobre a História do Brasil.
Na medida que caminhei e avancei no Movimento fui caindo na real e até que encontrei O Movimento Espíritas Progressistas e entre tantos, Os Espíritas à Esquerda, CEJUS, Coletivo Girassóis, a ABPE da Dora Incontri e outros. E realmente tenho percebido as incoerências dentro do Movimento Espírita.
Queridos irmãos,
Perdoe-me pelo que aqui irei comentar, mas política não há nada de ser relacionado à espiritismo, à Jesus, ao amor incondicional cristão que devemos nutrir pelo próximo.
Rotular vertentes espíritas como “Esquerda espírita”, “Direita Espírita”, “Chiquismo”, “Bolsoespiritismo”, é caminhar para trás, para longe do que nos está sendo proposto desde que a doutrina nos foi trazida por Kardec, divulgada por tantos e tantos médiuns e que há 2 milênios nos foi apresentada pelo nosso grande mestre maior, do qual, dispensa apresentações.
Partindo deste ponto, nos fica claro que todas as obras que buscam a elevação moral e espiritual do ser não estão erradas. Elas apenas se adequam da melhor forma ao momento ao qual foram concebidas pelos seus autores. Ora, a Bíblia, lida atualmente contém inúmeras inverdades, inúmeras mensagens falsamente interpretadas, seja pela falta de evolução moral, ou pela pobreza linguística ao converter o texto hebraico.
Dizer que o Capitalismo é errado, é o mesmo que o falso Comunismo é o correto. Não há (ainda) em nosso orbe, sistema econômico perfeito, que abrace igualdade e mérito em um só sistema, pois somos falhos ao ponto de ainda entrarmos em conflitos militares, de optarmos pela ganância, soberba, pela fama, pelo orgulho. Somos ainda egoístas, e se praticamos caridade, no fundo, é para nutrir nosso próprio EGO.
Viver na ilusão de que somos evoluídos por pensarmos diferente, por estarmos em uma seita ou seguindo uma doutrina que seja “melhor” que outra, é ainda estar patinando no barro.
Há e haverão incoerências, pois pensamos apenas com o ego, e não com o amor.
A única verdade da qual todos que seguem o Cristo sabem, ou deveriam saber, é que “Fora da caridade, não há salvação”.
Deixemos o egoísmo de lado, a raiva pelo próximo, que oprime, que exige, que se coloca como melhor, por achar saber mais do que o outro. Devemos caminhar juntos, unidos por um único objetivo, que é:
O Amor.
assino em baixo…parabéns pela lucidez meu amigo..??
O cristianismo e outras pregações morais tem o objetivo de estabelecer valores. Se meus valores são x e y eu, obviamente, me posicionarei na sociedade com os valores que considero e que defendo. Portanto, não é coerente não se posicionar e deixar que as coisas sigam ao sabor das ondas. Quem assim procede não internalizou os valores que diz seguir e defender. Ao nos posicionarmos nós nos deparamos com posiçoes contrárias e isto causa desgastes, conflitos e é por esta razão que muitos não se posicionam e deixam que tudo corra solto. Se a pessoa não se posiciona e não participa das lutas sociais ela é inútel para as questões sociais e políticas, torna-se um zero à esquerda.
Onde está o Amor em Bolsonaro?
Amor em não ser corrupto como os governos passados
O pior cego é aquele que não quer ver né, como diz o ditado.
Não é que recentemente ele falou que roubar dinheiro público com funcionários fantasmas é normal e q todo mundo faz…
Bolsonaro amou de tal maneira seu semelhante, que, por inação, causou o desencarne de centenas de milhares deles, fazendo-os abandonar essa casca velha e assim, possibilitando que volitem por aí, à vontade…
Ê isso mesmo. Reflexão perfeita é necessário separar o joio do trigo. Nem tudo é perfeito. Todos nós estamos num processo evolutivo inclusive Chico, André Luiz, Kardec… e aí vai. Menos egoísmo mais Caridade, menos orgulho mais humildade. O único caminho que sigo é meu grande Mestre Jesus e ouço com muita atenção meu orientador espiritual que sempre enfatiza que as escolhas são minhas e que sempre devo refletir tudo aquilo que leu ou ouço inclusive suas orientações. Agora apoiar o genocida, racista, misógino, homofóbico, negacionista, neofascista… ê demais. É negar a essência de Jesus e a literatura kardecista. Se todo ensinamento de Jesus MORAL – que é o que mais me interessa – então me considero um espírita socialista a favor da igualdade social, comida no prato sem exceção, saúde, lazer, trabalho, direitos iguais, sem discriminação em todos os sentidos, liberdade de consciência, de pensamento. Liberdade religiosa, de culto… e principalmente direito ao aborto respeitando a ciência médica, quando há o estripo… enfim, como espírita, leio e coloco em prática moral muitos outros ensinamentos como o Taoísmo/ Devemos exercitar todos os dias A Sabedoria do Silêncio Interno – prática que Jesus adotava nas suas profundas meditações. Único caminho. para mim, por mim e cada um ao seu tempo, de se conectar com Deus e com o mundo espiritual evoluído do amor, da caridade e da humildade. Força e Paz.
Artigo muito agressivo e violento. Como estudante da doutrina vejo as obras psicografias por Chico como complementares sim. Podem ter pontos a serem discutidos. Sim, o endeusamento de qualquer não é compatível com os ensinos espíritas, mas nem por isso deixaremos de reconhecer o trabalho e mérito de todos que o mereçam. Desde que não descambe pro fanatismo, qual o problema se Chico for a reencarnação do Kardec?
Esse artigo = opinião meio raivosa de uma pessoa sobre um assunto. Só.
Entre a opinião dela e a mensagem de Chico, prefiro ficar com o Chico.
Creio que os ensinamentos contidos no Livro dos Espíritos deveriam ser melhor estudados por aqueles que pretendem fazer do espiritismo uma salada de tendências, lamentavelmente maculada por vaidades pessoais. O endeusamento de personalidades é conflitante com a afirmação que aqui é um mundo de provas e pouco evoluído.
Kardec era declaradamente racista e Chico Xavier era direitista, e apoiava a ditadura. Apesar das obras de caridade e de toda importância do trabalho espiritual deles, é fato que ambos tem posições repugnantes nesses aspectos.
A verdade é que temos que buscar a espiritualidade dentro de nós mesmos e não ficar nessa idolatria, adorando e endeusando pessoas que não são perfeitas. Religião e pessoas não devem ser as bases da nossa espiritualidade, e sim valores voltados ao Bem e amor.
Discutir se Chico foi em outra vida tal e qual personalidade é irrelevante perante o mandamento maior dado pelo Cristo. Essa questão é uma brecha, onde as forças contrárias ao Bem, conseguiu dividir os cristãos espíritas ainda embalados por questões pessoais e egoísticas. Não sabendo como abalar a base do edifício da Codificação Espírita, so restou lançar dúvidas que a bem da verdade não levam a lugar algum, a não ser a divisão do movimento trazido até nós pelos Espíritos Superiores.
O que falta no planeta Terra, para que este dê um salto significativo rumo à condição de mundo feliz é única e exclusivamente AMOR. Conhecimento e intelectualismo (como esse texto, por exemplo) traz apenas aumento do ego. A Terra precisa mais de AMOR do que de CONHECIMENTO (seja científico ou filosófico).
Debater se o espiritismo é ou está rumo a essa ou aquela corrente filosófica ou política ou religiosa é ‘jogar pérolas aos porcos’, é o mesmo que colocarmos uma venda nos olhos ignorando as necessidades dos seres vivos que habitam o Planeta.
Não temos condições, em nível algum, de debater se Chico foi ou não Kardec. Isso é absolutamente irrelevante e as correntes que se dedicam a esse trabalho podem estar motivadas por questões de orgulho, vaidade, narcisismo etc. Afinal de contas, o que este conhecimento de fato trará à evolução do planeta no rumo de mundo de regeneração? Absolutamente nada.
Então, tomemos cuidado para não cairmos nas garras do orgulho e vaidade. Guarde-se para si o colóquio que temos com os Espíritos seja por mediunidade, intuição, inspiração etc.
Nao se pode colher frutos bons de árvores ruins. Essa frase de Jesus se aplica aqui muito bem, não se pode apoiar bolsonaro e dizer ser do bem ou evolução, quem com porco se mistura farelo come,e não deixo nada de bom desses impostores diabólicos chico e Kardec, atraso da evolução.
Não entendi a proposta desse texto. Essa relação com política e a depreciação das obras espiritas feitas, talvez sejam mais inerentes ao autor dessa matéria, do que às obras citadas por ele propriamente dito. Sei lá…
Ou talvez ele esteja certo?
Por hora, vale a leitura para reflexão e se fortalecer ainda mais na alta espiritualidade.
Oremos e cuidemos mais e melhor uns dos outros.
Que Deus nos abençoe sempre.
Abraços,
Celso.
Adorei esse texto. Me sinto totalmente representada. Muitos falam que não associam religião á política, porém nas entrelinhas mandam suas mensagens retrógradas e perigosas.