Releituras kardecistas – com Marcio Sales Saraiva

Releituras kardecistas – com Marcio Sales Saraiva
Nós, abaixo assinados, manifestamos nossa solidariedade ao povo brasileiro e extrema preocupação com o projeto de destruição nacional realizado pelo Governo de Jair Bolsonaro. A gestão da pandemia de Covid-19, responsável por mais de meio milhão de pessoas mortas no Brasil, é a face mais visível de um trágico empreendimento que inclui a destruição de ecossistemas e a venda de patrimônio nacional, o desejo de ani- quilação de culturas e povos originários, ataques aos direitos humanos, às populações indígenas e quilombolas, a criminalização de ativistas e de movimentos sociais, além da perseguição aos grupos mais oprimidos, como as mulheres e a população LGBTQI+.
Desde o início da pandemia, a política negacionista do Governo Bolsonaro demonstrou o desprezo do presidente e de seus apoiadores para com a gravidade da situação e pela dor de quem chora a perda dos seus. Discursos minimizando os efeitos do vírus (“é uma gripezinha”), incitando o ajuntamento de pessoas, desprezando o uso das más- caras, travando uma luta política com os que defendiam ações fundamentadas em informações científicas contra a pandemia, são publicamente conhecidos. Soma-se a isso o gasto público na promoção de remédios ineficazes e da recusa sistemática para compra de vacinas. É evidente o projeto genocida do Governo Bolsonaro, presente não só em suas declarações, mas também na adoção de medidas que facilitaram a propagação do vírus, em completa desconsideração para com a vida de milhares de brasileiros e brasileiras.
Os números são alarmantes. A fome avança e a insegurança alimentar já atinge mais da metade dos lares brasileiros. Os fracassos na condução da política econômica são uma evidência com aumento do custo de vida e desemprego. As pessoas pobres e negras são as mais atingidas. A desconstrução violenta das políticas de proteção ambiental tem levado o país a um verdadeiro ecocídio e envolve riscos concretos à vida de quem se opõe. O Governo de Bolsonaro é denunciado internacionalmente por descumprir convenções internacionais de que o Brasil é signatário, bem como é visível o desacato à Constituição brasileira. As notícias mais recentes revelam tentativas de superfaturamento na compra de vacinas, num quadro de grande atraso no processo de imunização.
Por isso, aliamo-nos aos protestos realizados em todo Brasil e em dezenas de cidades do mundo, clamando pelo apoio internacional pelo fim do genocídio e ecocídio em curso no Brasil.
Portugal, 28 de Julho de 2021.
A sociedade brasileira vive um momento de crise aguda, uma crise que afeta gravemente a saúde e o emprego do seu povo, além do meio ambiente onde vive. A fome se alastra e a violência ameaça todos e, em especial, os mais vulneráveis. Esse seria, pois, o momento em que os poderes instituídos pela Constituição Federal de 1988 deveriam unir esforços no sentido de superar tamanha crise social e econômica. Entretanto, o que se viu e ainda se vê nesse período de longa pandemia é o Poder Executivo federal caminhar no sentido oposto ao que é necessário e urgente, abdicando de seu papel de buscar soluções, para, ao invés, transgredir leis e ameaçar uma sociedade já tão fragilizada pelo momento tormentoso que passa e com o luto coletivo em que está mergulhada.
O povo brasileiro está horrorizado diante da escalada de ameaças ao Estado democrático e às liberdades sociais e políticas, vindas de integrantes do Palácio do Planalto e das Forças Armadas. Dia após dia, verbalizam eles seu desprezo pela democracia e atentam contra as demais instituições do Estado brasileiro. Recentemente o Senado Federal e o Tribunal Superior Eleitoral tiveram que se manifestar contra essa verborragia autoritária e ameaçadora vinda dessa gente que ainda não aprendeu a conviver numa sociedade livre.
Nós, espíritas progressistas, reunidos em diversos grupos, associações e coletivos pelo Brasil, reiteramos nossos valores de luta por uma sociedade na qual a justiça social e a liberdade plena sejam conquistas permanentes. Nesse grave momento, conclamamos as diversas instituições de Estado, em todas as esferas de poder, a se manterem fiéis aos princípios constitucionais e unirem-se no sentido de garantir a completa apuração dos fatos que levaram à morte de mais de meio milhão de brasileiras e brasileiros; e de garantir a condução do processo eleitoral previsto para o próximo ano, sem sobressaltos e sem ameaças. E, assim, possam assegurar ao povo a esperança de dias melhores, com a superação das crises que nos assolam.
Há um longo caminho a ser percorrido para construirmos uma sociedade mais justa e igualitária, mas não podemos mais retroceder os passos que já tínhamos dado nesse sentido. Que todos os brasileiros e brasileiras conscientes, que estejam em cargos nas esferas dos poderes executivo, judiciário e legislativo possam ter coragem e empenho, para agirem no sentido de garantia de nossos direitos fundamentais e da democracia.
Assinam esse documento os seguintes coletivos, associações e grupos:
ABPE – Associação Brasileira de Pedagogia Espírita
Abrepaz – Associação Brasileira Espírita de Direitos Humanos e Cultura de Paz
Ágora Espírita
Blog Livre Pensadora
Cejus – Coletivo de Estudos Espiritismo e Justiça Social
CEPA – Associação Espírita Internacional
CEPABrasil – Associação Brasileira de Delegados e Amigos da CEPA
Cetrans – Coletivo Espírita pela Transformação Social
CPDoc – Centro de Pesquisa e Documentação Espírita
EàE – Espíritas à Esquerda
Espíritas Progressistas
Girassóis – Coletivo Girassóis, Espíritas pelo Bem Comum
Brasil, 12 de julho de 2021
Elizabeth Hernandes – EàE DF
Dia de execução de bandido famoso é dia de falar mal “desse pessoal dos direitos humanos”. Onde estavam na hora em que o bandido matava pais de família? Por que só aparecem quando a polícia executa os bandidos? Essa última pergunta talvez seja respondida pelo fato de que a polícia divulga com mais frequência as suas ações, enquanto os bandidos tentam escondê-las.
Os Direitos Humanos estão onde sempre estiveram: ao lado dos humanos, defendendo humanos valores e opondo-se à barbárie cometida por qualquer tipo de bandido.
De onde saiu essa ideia de que defender direitos humanos significa ser a favor de atos ilícitos, imorais ou as duas coisas? Muito provavelmente essa ideia é difundida pelos que se beneficiam com a barbárie.
Certa vez, numa palestra de um advogado muito bem sucedido e fascinado pela cultura de “honestidade e horror à mentira” – palavras dele, dado que há controvérsias – vigente nos Estados Unidos, ele contava, orgulhosamente, que defendera o Estado contra um egresso do sistema carcerário que processou a Pátria, alegando que, no presídio, dormia com o rosto próximo à privada. “E onde mais deveria dormir um sentenciado? Por que o pessoal dos Direitos Humanos não leva pra dormir na casa deles?”
Quando você não defende direitos humanos, parte do princípio de que as pessoas se dividem em classes ou castas, talvez com variadas gradações, mas com a certeza de que você e os seus localizam-se num dos patamares superiores
Será impossível que um membro de uma família branca, abastada e letrada cometa um crime? De todo modo, se esse menino ou menina problemático (qualquer que seja a idade) vier a cometer um deslize, terá brilhantes causídicos à disposição.
Talvez um bacharel não cogite a hipótese de um parente vir a dormir – uma noite que seja – num cárcere. Mas é bom lembrar que a vida é imprevisível, doutor… E repleta de seres humanos com os quais temos de conviver. Melhor que esses “outros” tenham garantidos direitos fundamentais, como condições dignas de sobrevivência ou o devido processo legal.
É muita sorte da sociedade quando uma pessoa, que dormiu anos com a cara perto da privada, num equipamento estatal que está legalmente obrigado a preservar sua vida e integridade, está disposta a simplesmente processar o Estado. Haveria a probabilidade de essa pessoa sentir muito ódio. E tal sentimento ser jogado na cara ou na vida do primeiro que encontrasse, já que sentir ódio e concretizá-lo está tão fácil e acessível, nesse país.
Hoje todo mundo odeia alguém: políticos, empresários, blogueiros, a imprensa, os “comunistas”, o vizinho, os artistas etc. E alguns odeiam, de alma, coração, fígado e dedo indicador em posição de gatilho, o “pessoal dos Direitos Humanos”. E não vamos esquecer do ódio ao misterioso Lázaro, o assassino assassinado1, exemplo filmado de morte matada.
Por que não odiamos, por exemplo, Joseph Safra, bilionário libanês-brasileiro, morto em berço esplêndido, cuja fortuna fora estimada em US$ 18 bilhões? Ele controlava um conglomerado bancário e financeiro com ações em 19 países e foi acusado, numa operação da Polícia Federal, de pagar R$ 15,3 milhões em propinas.
De acordo com a imprensa, interceptações telefônicas e fotografias mostravam toda a movimentação de um provável preposto do grupo Safra, negociando a “gorjeta” que valeria a dispensa de 1,8 bilhão de reais em tributos. O bilionário foi inocentado. Não houve como provar sua relação com o corruptor, que aparece em fotos voltando para a sede do grupo Safra, após o conluio com os corrompidos. Embora o grupo Safra tenha-se beneficiado na negociata, caso ela tenha-se concluído, a Joseph Safra – que certamente não passará pelo buraco de uma agulha antes de um camelo – não se aplicou nem mesmo uma teoriazinha de “domínio do fato”. Ele tomara o cuidado de não ser sócio e nem empregador do negociador.2
Então um bilionário foi inocentado e… ninguém bateu panelas? Por quê? Seria porque “a conversa não chegou na cozinha, a plebe ignara não tomou conhecimento”?
E quantos direitos humanos poderiam ser garantidos com 1,8 bilhão de reais, se investidos em programas sociais? Só pra lembrar: saúde, educação e segurança são direitos humanos.
E o que diria o cidadão de bem?
“Ora, ora, ora. Lá vêm esses comunistas a falar em programas sociais. A continuar nessa toada, logo vão chamar de genocídio a mortandade de mais de meio milhão de brasileiros só porque o governo atrasou a compra de vacinas, desmontou o sistema de vacinação3, que era referência internacional e não adotou estratégias efetivas para o fechamento de cidades, como ocorreu em países que já estão voltando a um modo de vida sem pandemia. Ora, ora, ora, direitos humanos. Só servem para beneficiar ‘os pês’: pretos, pobres, preguiçosos, petistas…”
Será que nós, os brasileiros, somos assim tão “brancos”, ”ricos”, “diligentes e civilizados”, a ponto de poder dispensar o trabalho desse “pessoal dos direitos humanos”? E será que acreditamos em teorias deterministas para a hora da morte, mesmo quando mais de meio milhão de compatriotas morre por uma doença para a qual há vacina e medidas outras de prevenção?
Há espíritas argumentando que “cada um tem sua hora” e citando os casos de desencarnações coletivas previamente combinadas etc. Sobre isso, um artigo de Carlos Augusto Parchen4 analisa questões, de O Livro dos Espíritos, que tratam da determinação da duração da vida. O articulista conclui que “Pode-se, portanto, afirmar que existe “um momento da morte” (ela ocorrerá inexoravelmente), mas não “o momento da morte” (ou seja, que ela está determinada e programada previamente).
A hora de morrer também é sobre direitos humanos. O direito de fruir a vida em toda a sua extensão e não ter a encarnação abreviada por fatores externos à responsabilidade pessoal. Na literatura científica, tais fatores são classificados como Determinantes sociais de Saúde.5
Direitos Humanos – e o respectivo “pessoal” – não seriam necessários num país que vivesse deitado eternamente em berço esplêndido, ao som do mar e à luz do céu profundo, em pleno estado de ordem e progresso. Não é o caso do Brasil.
É preciso valorizar o “pessoal dos direitos humanos” porque eles costumam empenhar a própria vida para defender as nossas vidas e, às vezes, perdem as vidas deles ou a de pessoas que lhes são caras.6
O Espiritismo não permite atitudes à moda do avestruz. Há vasta literatura que impede o impulso de enfiar a cabeça sob a terra, quando a realidade está feia de se encarar.
Se alguém aprova execuções sumárias – mesmo de perigosos assassinos – está relativizando o valor da vida, está aceitando que mortes matadas e mortes morridas são a mesma coisa. Se acredita em sintonia espiritual, está vibrando na mesma faixa da pessoa executada, bem como da dos executores. Se contribuiu, por ação ou omissão, para a constituição das autoridades que carregam nas costas a conta de mais de meio milhão de mortes que poderiam ser evitadas, é corresponsável. E se, depois de constatados tais sentimentos, continua se dizendo cristão, não entendeu nada sobre a religião inspirada nos ensinamentos de um palestino inocente, que foi denunciado, torturado e executado dentro de um processo legal conduzido pelas autoridades da época.
A boa notícia é a lição de misericórdia que nos deixou o Palestino. Reconcilie-se, principalmente consigo mesmo, enquanto está a caminho.