15 de outubro: o poder libertador da educação para todas as pessoas

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COLUNA Feminismos com Paula Lau (EàE-RS)

Antonieta de Barros é homenageada em mural no centro de Florianópolis. Foto Reprodução
Uma das três primeiras mulheres eleitas no Brasil (a primeira negra), sua bandeira política era o poder libertador da educação para todas as pessoas: Antonieta de Barros (1901-1952), a parlamentar negra pioneira que criou o Dia das/dos Professoras e Professores. Em um país que tem Paulo Freire como patrono da educação, é necessário e justo dar visibilidade e ecoar vozes para mulheres como Antonieta de Barros e Lélia Gonzalez, invisibilizadas e silenciadas pelo patriarcado e pelo racismo. O marco do 15 de outubro é resultado do trabalho, persistência e rompimento de barreiras raciais, de gênero e de classe de uma filha de ex-escravos (Antonieta foi eleita menos de meio século após a abolição da escravatura), que acreditava que a educação era o caminho para o futuro. A professora, jornalista, escritora e política Antonieta de Barros instituiu o dia para que educadoras e educadores ganhassem visibilidade como importantes agentes das necessárias mudanças na sociedade. Ela foi inicialmente eleita deputada em 1934 para a Assembleia Legislativa de Santa Catarina, sendo natural de Florianópolis. Escreveu dois capítulos da constituição catarinense, sobre Educação e Cultura e Funcionalismo, até ser destituída do cargo pelo golpe de Getúlio Vargas. Pela Lei nº 145, de 12 de outubro de 1948, Antonieta criou o Dia da/do Professora e Professor, para em outubro de 1963, o então presidente João Goulart, tornar a lei nacional. Sua defesa pela educação fez com que ocupasse as páginas dos jornais. Além de professora, virou cronista. Em 23 anos de trabalho para a imprensa escreveu mais de mil artigos em oito veículos e criou a revista Vida Ilhoa. Era respeitada e admirada por seu espírito de justiça. Além de um dia para celebrar a importância de valorizar educadoras e educadores, Antonieta de Barros criou outras leis importantes, como bolsas de cursos superiores para alunas e alunos em situação de vulnerabilidade social e concursos para o magistério, para elevar o ensino público e evitar apadrinhamentos. “A grandeza da vida, a magnitude da vida, gira em torno da educação.” Antonieta de Barros, uma ser humana visionária! #antonietadebarros #educação #cultura #politicapublica #mulher

Dignidade Menstrual: o sangue ainda sangra

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COLUNA – Feminismos com Paula Lau (EàE-RS) colaboraram Elizabeth Hernandes (EàE-DF) e Mariela Bier (EàE-RS)

A misoginia nunca esteve tão explícita. No mais poderoso cargo político do país e nas decisões perversas de um judiciário estruturado a partir do patriarcado (que inocenta estupradores sistematicamente, matando compulsivamente as mulheres várias vezes em uma mesma ‘vida’).

Ao mesmo tempo em que todas estas aberrações contra a vida de quem gera vidas acontecem (lembrem, lembrem sempre: todas, todos e todes chegamos à Terra pelo ventre de uma mulher), nunca estivemos tão fortes, unidas e conscientes, além de termos ferramentas de comunicação e decisões potentes em mãos (mesmo que os algoritmos, também criados pelo machismo estrutural, teimem em tentar nos silenciar).

Estamos ruindo esta estrutura ultrapassada, violenta e letal por dentro. Não tem mais volta. A vida prevalecerá, afinal, nossa luta é regida pela potência de nossos úteros, machucados e adoecidos por esta estrutura forjada pela masculinidade frágil, descompensada e desconectada do amor e do afeto que tenta, de toda e qualquer forma mais perversa se manter, ao mesmo tempo e proporção em que se esvai.

É uma questão de tempo, de ação agora, firme e urgente para tentar reduzir o número de vidas ceifadas pelo modus operandis do ‘patriarcapital’.

E nós aqui, seguimos sonhando com o dia em que as políticas públicas proporcionarão possibilidades para que todas nós façamos uso dos nossos absorventes de pano com dignidade, tranquilidade e afeto. A vida prevalecerá.

Menstruação foi (e ainda é) assunto tabu rodeado de dogmas e mitos. Falar sobre educação, higiene e saúde menstrual tem impacto direto na saúde (ginecológica, psicológica, mental, emocional e espiritual) de meninas e mulheres.

Um olhar de acolhimento e informativo por parte da família, da sociedade para com seres menstruantes e suas demandas e necessidades, junto à responsabilização do poder público, são fundamentais, assim como quando falamos sobre educação sexual (outro assunto que seres pervertidos, abusadores, desinformados, pedófilos, misóginos e estupradores abominam).

Ver o ciclo menstrual como um aspecto positivo, de vida, de sabedoria, de saúde, muito além da possibilidade de reprodução, desmistifica, desconectando da ideia de sujeira, impureza, doença, perda e falha, aspectos estes trazidos pela cultura patriarcal para diminuir e fragilizar mulheres e meninas no decorrer dos tempos e que, incutidos em nossa psique, tornaram-se causas de dores, desconfortos e até doenças.

Dignidade menstrual, educação menstrual, distribuição de absorventes em espaços e banheiros públicos e nas escolas é política pública de primeira necessidade em qualquer sociedade minimamente evoluída e deve envolver, além das mulheres e meninas, todas as pessoas. Tudo isto mexe na estrutura da cultura e do sistema vigente, abrindo novas e saudáveis narrativas sobre a menstruação, inclusive compreendendo-se aspectos psicológicos, emocionais e fisiológicos que causam TPMs, enxaquecas, cólicas, miomas, SOPs, candidíase…

Desmistificar a menstruação torna meninas-mulheres mais confiantes e com propriedade sobre o próprio corpo, e meninos-homens mais empáticos e envolvidos com questões de saúde, planejamento familiar, responsabilidade afetiva e sexual.

A falta de acesso a informação, saneamento e produtos para o cuidado menstrual afeta milhões de seres menstruantes no Brasil, física e emocionalmente, fazendo com que corram riscos, desenvolvam baixa autoestima e não aceitação do próprio corpo, tenham problemas e doenças uroginecológicas, parem de ir à escola, tenham suas possibilidades de desenvolvimento limitadas. A quem interessa que isso aconteça senão à manutenção do patriarcado?

O poder público tem a responsabilidade de oferecer meios para que os cuidados sejam viáveis: projetos de lei são uma das formas mais concretas de se realizar essa transformação, desembrutecendo e mudando o ritmo do acontecer das coisas.

É uma questão de humanidade e civilidade derrubar o veto do necropresidente ‘cristão’ defensor da política corrupta da morte em nome de ‘deus’ e contamos com parlamentares capacitadas/capacitados/capacitades para isso.

É questão que afeta todas, todes e todos. A vida das mulheres que menstruam, que não menstruam ou que ainda vão menstruar sofre ameaças todos os dias. Defender a dignidade das mulheres é defender a humanidade.

A vida vai prevalecer.

#essasmulheres #mulher #mulheres #feminismo #filhas #cultura #educação #dignidade #mães #dignidademenstrual #pobrezamenstrual #livreparamenstruar

Filme Je suis Karl alerta para os perigos neonazistas

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Por Gastão Cassel, Espíritas à Esquerda SC

O filme Je suis Karl, lançado recentemente no catálogo da Netflix, traz mais uma vez para as telas o debate sobre movimentos neofascistas e seus métodos para cooptar e fanatizar jovens. A produção alemã e tcheca, dirigida por Christian Schwochow, ambienta-se na Europa e tem como pano de fundo a fobia aos imigrantes com fortes elementos de supremacia branca. O enredo conta a história da jovem estudante Maxi que teve a mãe e dois irmãos mortos em um atentado a bomba. Ela é abordada por um jovem sedutor, Karl, que a convida para um seminário de verão cujo lema é “assuma o controle”.
Cena do filme em que protagonista faz discurso pela “regeneração” da Europa.
A organização de Karl assedia a juventude com um discurso sobre segurança erguido sobre a xenofobia e sobre a proposta de destruição do sistema como um todo, já que este “não faz nada por nós”. O seminário tem todos os requintes de um culto, com depoimentos testemunhais (alguns falsos, inclusive), muita música temática, discursos extremistas e o compromisso coletivo de ocupar vagas nos legislativos e postos de docência para minar o sistema. Outra característica da organização é que ela se diz “nem de direita, nem de esquerda” para dizer que são conceitos ultrapassados. Mas defendem a pena de morte, a expulsão de imigrantes e falam até em “raça superior” quando um suposto rapper aparece cantando: “Foda-se a sociedade e suas regras que nos causam desconforto. Nossa raça é superior. Falamos do fundo do coração. Raça Branca Primeiro”. O uso das redes sociais como forma e método de difusão dos discursos de ódio também é escancarado no filme. O próprio nome do filme faz alusão às hashtags #eusou #somostodos largamente usadas mundo afora. Tudo é midiatizado, inclusive atentados, como os que matam a família da personagem Maxi, são planejados pelo grupo para culpar imigrantes islâmicos e gerar mártires de pele clara. O repertório estético e discursivo de sedução dos jovens é igual ao de qualquer seita ou religião obtusa: apelos afetivos, vitimização, chamados a fazer a diferença e assumir o controle, repulsa a um sistema como um todo, destruição de referências e criação da noção de pertencimento pelo discurso, vestimentas, símbolos e gestuais. Em resumo, é um filme muito atual. Fala de coisas que vemos no nosso quintal nas milícias físicas ou digitais, nos métodos bolsonaristas, nas más igrejas neopentecostais (que não são todas). É o discurso da “escola sem partido”, da desconfiança sobre o sistema eleitoral e das instituições democráticas. O filme é um alerta sobre facilidade de como o neonazismo e o neofascismo se apresentam e operam. Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência.

VEJA O TRAILER OFICIAL

 

Ativista Antônio Isupério, da coordenação do EàE, recebe ameaça de morte de supremacistas

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isupério
Antônio Isupério

O ativista LGBT+ e Antirracista Antônio Isupério, membro da Coordenação do Coletivo Espíritas à Esquerda foi ameaçado de morte pelo supremacista Aristides Braga no Instagram. “O que a gente vai fazer contigo é do tamanho patamar de aqueles vídeos dos chilenos cortando cabeças”, ameaçou Braga.

O fúria foi deflagrada após Isupério ter denunciado uma postagem em que Israel Soares faz declarações e saudações nazistas. Três dias depois da denúncia a polícia executou um mandado de busca e apreensão na casa de Israel quando foram apreendidos equipamentos eletrônicos. O suspeito de apologia ao nazismo continua em liberdade.

 
 
 
 
 
 
 
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Uma publicação compartilhada por LGBT ANTIRACIST ✊??️‍? (@isuperio)

O post de Israel foi foi excluído pelo Instagram, mas Isupério fez a repostagem com comentários. Imediatamente, no dia 31 de agosto de 2021, o ativista começou a receber comentários, mas entre eles destacou-se o de Aristides Braga:

“Cara, faz agora mas tu faz agora o BO porque o tanto de gente que tá atrás de ti. A gente vai te achar e oque a gente vai fazer contigo é do tamanho patamar de aqueles vídeos dos chilenos cortando a cabeça dos caras. Ouve bem, tu não ta mecendo com 2 3 pessoas tu ta mechendo com um vespeiro de mais de 5 mil pessoas que ODEIAM judeus e agora sabem que tu é judeu.”

 

Braga mora em Novo Hamburgo, no RS, e é filho de um comissário de polícia. Isupério tem um outro vídeo postado em que Braga tenta falar alemão, num possível indício indício de ligação com células neonazistas, especialmente pelo conteúdo antissemita da mensagem.

Segundo a pesquisadora Adriana Dias, há cerca de 530 células supremacistas que cresceram desde 2019 no Brasil.

Antonio Isupério utiliza seu Instagram como plataforma de exposição dos casos de violência e discriminação nas redes sociais. Foi ele que expôs Victor Sorrentino (o médico que foi preso no Egito) por sua fala misógina contra uma balconista. O apresentador Sikera Júnior também teve suas falas homofóbicas denunciadas no seu perfil.

Isupério relatou a ameaça de morte ao Ministério Público (protocolo MPF 20210079114) e aguarda por uma reposta da instituição.

Suspensão temporária

Coluna Feminismos com Elizabeth Hernandes (EàE-DF)

No dois de outubro de 2021 foi dia de sair às ruas –outra vez– para defender o de sempre. Democracia, oxigênio, floresta, povos originários; terra, comida e teto; saúde, educação, arte, cultura (não necessariamente em ordem ou hierarquia). O direito de permanecermos vivas e lindas, vivos e lindos, vives e lindes, qualquer que seja nossa cor de pele, nosso jeito de bem querer corpos ou venerar almas. Foi dia de dizer que essas coisas não são precificáveis, não estão à venda e nem serão trocadas por quinquilharias. Não se respira ouro, não se come dólar e ninguém transa com o Mercado. Peraí. Acho que tem gente que transa com o Mercado, sim, mas esses ficam lá na Faria Lima, em horário comercial e ontem era sábado. Fomos dizer àquela gente que gosta de produzir lixo que, nós, preferimos viver.
Espíritas à Esquerda presente nas manifestações em Brasília.
Nunca foi fácil e, agora, menos ainda. Estamos no meio de uma pandemia causada por um vírus que se espalha de modo sub-reptício. Uma praga tão relacionada à essência do conservadorismo que, para nos defendermos, temos que tomar atitudes e cuidados semelhantes aos da época da teoria dos miasmas. E, além de abrir janelas e arejar a casa (de quem tem uma), a gente precisa se movimentar e interagir o mínimo possível, fazer o essencial e se aquietar, porque a peste tá solta. Mas têm dias que o único jeito de a enfrentar é indo à rua. Viver é mesmo essa rebeldia todo dia. Daí saímos nós, os divergentes, jurando que vamos nos cuidar mutuamente, afinal, temos experiência e gosto pelo ato. Mas é tanta coisa nova, tanto protocolo sanitário que… às vezes a gente esquece e… se descuida. Aqui, na parte do descuido, talvez alguém vá lembrar que a esquerda não se cuida e só se une na cadeia. Reconheço um pouco de verdade no chavão. Somos assim como irmãos em uma família meio “disfuncional”. Alguém aí me informe onde residem as “funcionais”, por favor? Se tudo funcionasse perfeitamente, por que teríamos de nos agrupar em pequenos bandos? Então tá. Somos irmãos que se estapeiam mesmo, porém, só quem pode bater no meu irmão, sou eu, tá certo? Tá, não. O ideal é ninguém bater em ninguém. A gente chega lá. Um dia. Eu estava na Esplanada dos Ministérios com o meu novo e chiquérrimo cartaz do Espíritas à Esquerda, “Fora da justiça social não há salvação”, patrocinado por mim mesma, feito em gráfica e tudo. Tudo dentro do normal: cumprimentos com distanciamento, beijinhos mascarados jogados de longe, fotos com gente conhecida e com gente se conhecendo, discursos, aplausos, vaias, risadas, crianças e cachorros. Havia treze partidos de esquerda (não resisti ao número!) e diversos movimentos e coletivos. Todos tentavam manter o tal do distanciamento obrigatório, afinal, esperar é resistir e vice-versa. A gente não vai facilitar para um vírus que acha que aqui é o século XIX! Não mesmo! De repente me apareceu uma mana cujo sorriso não podia ser ignorado porque estava nos olhos e no corpo todo, gritando: “Meu Deus, eu não acredito! Tem espírita aqui! Eu tô tão feliz! Tira uma foto comigo!” Fizemos a foto e ela partiu para o abraço, literalmente. E de repente se deu conta dos protocolos e cuidados, soltou rápido, ficou sem graça: “Desculpa! Fiquei tão alegre que esqueci que não pode abraçar” E sumiu na multidão, constrangida e feliz. E eu fiquei ali, contaminada. De amor. Meu cérebro afirma, com base em literatura científica, que todas as vezes que saímos à rua aumentamos sim, a “odds ratio” para o desfecho covid, comparando com o grupo que ficou em casa. (Aqui é só pra falar difícil e impressionar os epidemiologistas.) É assim: qualquer interação, seja ir à padaria ou protestar pelo preço do pão, pode ser medida em termos de risco de adoecer. Mesmo com as vacinas e com a obediência aos protocolos sanitários prescritos com base em evidências. Mas o meu coração me assegura, com base em evidências sentimentais que, em certos momentos, durante alguns segundos, a pandemia é suspensa. Durante alguns segundos ninguém se contamina. Esse momento de ser abraçada por uma desconhecida foi um deles. Como estaríamos aqui se não houvesse uma trégua de vez em quando?

Carta a Kardec nos seus 217 anos

Por Dora Incontri
 
Querido mestre! 217 anos de teu nascimento e o quanto a face do mundo se transformou! Nesse lapso tempo, o planeta teve mais mudanças do que os últimos 2 mil anos. No rio da história, que se mostrou tão violento e turvo, lançaste algumas ideias transformadoras. Elas quase se perderam diante de tantas turbulências por que passamos. Abriste a porta da mediunidade de forma racional e investigativa, ética e desmistificadora. Entregaste-nos algumas chaves importantes para lidar com o mundo espiritual e sonhaste com uma filosofia moral que pudesse ajudar a transformar a terra.
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Allan Kardec – Foto Divulgação/Instituto IDEAK
Propunhas métodos científicos, dentro das possibilidades restritas do teu momento histórico e criaste novos caminhos de espiritualidade, sem hierarquia, sem sacerdócio, sem dogmas, sem instituição – uma espiritualidade livre, crítica, sem amarras e que se ancorasse em pesquisa e racionalidade.
Fizeste um esforço hercúleo, um trabalho exaustivo, em poucos anos, gastando tua saúde, enfrentando aluviões de críticas e traições, sempre em meio a extrema dificuldade financeira.
E eras “apenas” um professor, de classe média, bem média, sempre às voltas com finanças precárias, sempre idealista pela educação do povo. Discípulo honrado do grande mestre Pestalozzi.
Hasteaste bem alta a ideia da reencarnação, para que ela nos restituísse a gestão de nós mesmos, num processo de autoeducação, pelo qual somos os responsáveis na passagem dos séculos, nas múltiplas vidas.
Tudo em tuas obras nos oferece equilíbrio, liberdade, caminhos novos, frescura de espírito…
Mas é claro que eras um ser humano, tiveste teus limites, pertencias a uma época. Qualquer homem ou mulher, em qualquer século da história, tem suas raízes em seu tempo e não pode ser julgado pelo futuro, sob a perspectiva dos avanços que o tempo traz. Deve antes ser reconhecido pelo que lhe foi dado vislumbrar desse futuro, e em que se adiantou em seu tempo.
Dói-me, mestre, que muitos te abandonam hoje, depois de terem se saciado de tuas sábias orientações, envergonhados de se proclamarem teus discípulos. Para muitos, não passas de tacanho e limitado professor primário que teve pretensões positivistas em relação a uma pseudociência ou um autoproclamado missionário com ilusões de reforma do cristianismo.
E ainda por acréscimo, justamente o país que mais te conhece, que mais te aclimatou – o Brasil – é também o que mais te desfigura e te trai.
Quero aqui apenas te agradecer e proclamar, como tenho sempre feito, a minha lealdade ao teu projeto, que aliás foi inspirado pelo próprio Cristo. Para isso, não é preciso que eu abandone meu espírito crítico, minha capacidade de análise histórica – coisas aliás que desenvolvi justamente em contato com a leitura de tuas obras. Tu mesmo nos ofereces os instrumentos e nos pedes para fazermos uma leitura aberta e não dogmática de teus escritos.
Sei que continuas inspirando aqueles que sinceramente se identificam com teus ideais superiores e se comprometem a continuar tua semeadura! Sei que me inspiras também e sinto-me conectada ao teu coração amoroso, desconhecido pelos que te supõem erroneamente dono de uma austeridade fria. Distribuíste esse teu coração para centenas de alunos, milhares de leitores, inúmeros espíritos e hoje o vemos impresso nessas cartas tuas que estão vindo vagarosamente a público!
Obrigada pelo teu nascimento, mestre! Obrigada pela tua vida e tua missão bem cumprida! E inspira-nos ainda com teu bom senso, com tua profunda espiritualidade e com tua retidão!
 

EàE e ABPE lançam pré-venda do livro “Espiritismo, sociedade e política: projetos de transformação”

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Uma maravilhosa novidade: o pré-lançamento do livro “Espiritismo, sociedade e política: projetos de transformação”, organizado por Dora Incontri e Sergio Mauricio.  O Espíritas à Esquerda (EàE) e a Associação Brasileira de Pedagogia Espírita (ABPE) juntaram-se para produzir a obra que será lançada pela Editora Comenius. Nesse livro, com 15 autores diferentes, são feitas reflexões sobre as relações entre o espiritismo, a sociedade e a política. Haverá duas “lives” de pré-lançamento: na segunda-feira, 4 de outubro, 17:30h, no canal do YouTube da ABPE, e outra, na sexta-feira, 8 de outubro, 20h, nas redes sociais do Espíritas à Esquerda. Ambas as “lives” terão a presença dos dois organizadores do livro. Esse livro é mais um grande esforço no caminho da produção teórica, dando aos espíritas progressistas mais material de análise e reflexão sobre essas importantes questões. Outras novidades ainda virão, mas esse primeiro passo, tão significativo para nós, deve ser comemorado e divulgado entre os espíritas progressistas.

O espiritismo e os alienígenas

Coluna Releituras kardecistas com Marcio Sales Saraiva

Um dos pilares do espiritismo é a convicção de que existe uma pluralidade de mundos habitados e não somente o planeta Terra, onde atualmente vivemos. Isso é inequívoco em “O livro dos espíritos”, na questão 55:

Todos os globos que circulam no espaço são habitados?

Sim, e o homem terreno está bem longe de ser, como acredita, o primeiro em inteligência, bondade e perfeição. Há, entretanto, homens que se julgam espíritos fortes e imaginam que só este pequeno globo tem o privilégio de ser habitado por seres racionais. Orgulho e vaidade! Creem que Deus criou o universo somente para eles.

Orgulho e vaidade é achar que o universo é todo nosso. Esta é a resposta dos espíritos.

Não se trata, é óbvio, de mundos iguais à Terra. Os espíritos dizem que “eles absolutamente não se assemelham” (questão 56, LE) com o nosso planeta azul.

Os seres que habitam estes outros mundos também não são iguais aos humanos terráqueos, da mesma forma que “os peixes são feitos para viver na água e os pássaros no ar” (questão 57, LE). Kardec explica que “As condições de existência dos seres nos diferentes mundos devem ser apropriadas ao meio em que têm de viver”. Nada mais lógico do que isso.

Jesus de Nazaré disse: “Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito” (João 14:1,2).

Casa de Mozart em Júpiter, publicada na Revista Espírita, ano 1858.

Allan Kardec, em “O evangelho segundo o espiritismo” (OESE), capítulo 3, está consciente de que há possibilidades diferentes de interpretação desta passagem, mas o fundador sinaliza para a primeira leitura:

A casa do pai é o universo. As diferentes moradas são os mundos que circulam no espaço infinito, oferecendo aos espíritos desencarnados estações apropriadas ao seu adiantamento” (OESE 3:1).

Sendo o universo a morada da divindade, nele encontramos pluralismo de populações. A Terra é apenas uma delas. Há diversidade de mundos habitados e cada um tem desenvolvimento cognitivo e espiritual distinto, pois

[…] há os que são ainda inferiores à Terra, física e moralmente. Outros estão no mesmo grau, e outros lhe são mais ou menos superiores, em todos os sentidos. Nos mundos inferiores a existência é toda material, as paixões reinam soberanas, a vida moral quase não existe. À medida que esta se desenvolve, a influência da matéria diminui, de maneira que, nos mundos mais avançados, a vida é por assim dizer toda espiritual” (OESE 3:3).

E nessa diversidade de mundos inferiores à Terra e outros que lhes são superiores, há os mundos intermediários, mais ou menos como o nosso, “o bem e o mal se misturam, e um predomina sobre o outro, segundo o grau de adiantamento em que se encontrarem” (OESE 3:4).

A convicção espírita sobre a pluralidade de mundos habitados é bem anterior aos modismos ufológicos do século XXI e ainda não encontra uma resposta positiva na ciência, apenas indícios ou razoabilidade filosófica. Em outras palavras, a ciência humana ainda não tem fatos concretos que corroborem essa convicção espírita que nasce com as comunicações dadas pelos espíritos, alguns inclusive de outros planetas.

Ainda sem o respaldo da ciência, o espírita poderá deixar essa convicção “pendurada” até que o tempo possa ou não confirmar. É uma hipótese válida, mas não sendo o espiritismo dogmático, ele não poderia exigir de seus adeptos uma crença cega nesse ponto, apenas uma abertura mental e uma confiança no que dizem os espíritos sobre o assunto.

É importante compreender isso porque o tema caiu no ridículo e não faltam médiuns dispostos a psicografar sobre coisas de outros planetas, incluindo naves estelares de Júpiter, que não encontram respaldo nas ciências deste mundo e nem no bom senso, na razoabilidade.

Sendo assim, façamos como Allan Kardec e tenhamos sempre um pé atrás quando alguém diz falar em nome de “espíritos de outros planetas” ou que já testemunhou comunicações com “extraterrestres”. Não vamos confundir as pesquisas sérias neste campo, como o Paradoxo de Fermi e a hipótese do zoológico —e é com elas que o espiritismo deve dialogar—, com algumas viagens alucinógenas sobre espíritos de supostos comandantes de frota intergalácticas. “Tudo temos de ter cautela”, disse Titão Passos em “Grande sertão: veredas” de Guimarães Rosa. E assim deveria ser no espiritismo que leva a sério o legado de Allan Kardec.

Suicídio não é ter razão; é ter sentido.

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Por Marcia Costa – EàE-DF

“Em geral, aqueles que se arrojam ao suicídio esperam livrar-se para sempre de dissabores julgados insuportáveis, de sofrimentos e problemas insolúveis pela tibiez da vontade descuidada […]”. “Memórias de um suicida”, psicografia de Yvonne Pereira, ditado pelo espírito Camilo

“Suicídio não é ter razão; é ter sentido. É um ato de controle sobre o corpo. Autocontrole, se conduzido voluntariamente. Controlado por outro, se um ato de coerção ou homicídio dissimulado.” “Eleanor Marx: uma história”, de Rachel Holmes

A existência física é o desafio do espírito diante das contradições do mundo. E nós, espíritas, sempre fomos “doutrinados” a aceitar de forma acrítica que reencarnamos para experimentar a dor e o sofrimento, como se a proposta divina da reencarnação devesse ser um campeonato na qual aqueles que mais se mortificam (ou são mortificados) são candidatos aos prazeres espirituais no pós-vida. Declaram os espíritos na resposta à questão 259 de “O livro dos espíritos”i que escolhemos o roteiro de nossa jornada, deixando as demais ocorrências na dinâmica das relações com pessoas e instituições. Não há fatalidade, mas a livre escolha dos caminhos a seguir na transformação espiritual. Mas somos realmente livres para escolher como caminhar em nossa existência?
Foto Ben Blennerhassett/Unsplash
Cada momento da história da humanidade traz em si contextos pré-determinados para a existência que variam de acordo com o lugar geográfico, cultura, gênero, raça e, principalmente, sistema econômico. Há tempos instalou-se em nosso planeta de forma hegemônica (mas não sem luta) o sistema capitalista que, tal como a fábula do Rei Midas, a tudo vem transformando em mercadoria: arroz, feijão, alface, televisão, sexo, prazer, arte, cultura, felicidade, trabalho, fé, vida. A existência se transforma em valor determinado pela capacidade de produzir em condições que estão aquém da capacidade individual de escolha. Esse mesmo sistema cria um catálogo de pessoas, separando-as em caixas em que são medidas pela sua utilidade e função em produzir essas mesmas mercadorias, estabelecendo em qual lugar cada ser humano deve estar na sociedade a partir de ideologias conservadoras de ordem social, política e religiosa. Mas, ainda assim, o espírito –o ser que sobrevive à morte– busca sentido para continuar seu percurso na vida, envolto nessa contradição entre a opressão material e o direito espiritual a uma existência em que lhe seja garantida a dignidade para contribuir na construção do Reino de Deus. Nessa condição de oprimidos encontramos bilhões de almas espalhadas por todo o planeta e, no Brasil, é possível destacar que pessoas negras, indígenas e LGBTI são aquelas submetidas a um fardo que vem sendo erroneamente atribuído, por diversas correntes espíritas, às suas escolhas ao reencarnar ou a um pretenso castigo devido a faltas passadas. Ainda que se pressuponha o conhecimento prévio das condições, conforme questão 264 de “O livro dos espíritos”ii a encarnação não é um destino absoluto, mas uma proposta na qual existe um compromisso de todas as individualidades que aqui reencarnam em praticar a lei de Deus e construir uma ordem social fundada na justiça e na solidariedade. Por isso, espíritas, é preciso superar o pensamento de que o suicida é um espírito em desequilíbrio, obsidiado, egoísta, “que não têm a coragem de suportar as misérias da existência”… Somos, enquanto sociedade, responsáveis pela decisão desesperada de quem não teve o fundamental apoio para garantir a continuidade de sua existência, em níveis indispensáveis à manutenção da vida, seja sob o aspecto material, social ou psicológico. Não faltam estudos acadêmicos que demonstram que em diversas etnias indígenas o suicídio é determinado por fatores de risco como pobreza, baixos indicadores de bem-estar, desintegração das famílias, vulnerabilidade social, falta de sentido de vida e futuro, em decorrência de reassentamento e realocação das terras. E todas essas condições são dadas pela apropriação das terras indígenas por mineradoras e agronegócio, para expansão de suas atividades econômicas, provocando a dificuldade de sobrevivência e existência dos povos originários. A professora doutora Jeane S. Campos Tavares destaca que: “quando o terapeuta não reconhece o racismo como produtor de iniquidades sociais, preconceito e discriminação, contribui para aumento de sofrimento psíquico de seu paciente negro e para a manutenção das desigualdades raciaisiii”. E esse sofrimento é provocado pela racialização da força de trabalho com o único objetivo de multiplicar a exploração desses seres humanos submetendo-os a condições de trabalho degradantes e desumanas, sem deixar de mencionar a violência estrutural que estimula agressões físicas e psicológicas e até mesmo o assassinato de pessoas negras. Portanto, não causa admiração que em 2016 o Ministério da Saúde tenha registrado que o risco de um jovem negro cometer suicídio foi de 45%iv. Os LGBTI, assim como as mulheres, também estão sob influência de uma sociedade patriarcal que pretende controlar seus corpos e sexualidade. Caminhando nesses limites existenciais criados para estabelecer o padrão heteronormativo que permite o suporte à estrutura capitalista da família tradicional, estão submetidos ao preconceito e à exclusão social em ruas, escolas, universidades e locais de trabalho. Vivem a cada instante a realidade do medo por não ter proteção para ser quem são e relacionarem-se com quem escolhem. Segundo o psiquiatra Bruno Branquinho, jovens LGBTI pensam três vezes mais em suicídio que cisgêneros heterossexuais e têm cinco vezes mais chances de colocar a ideia em práticav. Espíritas, antes de atribuir seus julgamentos cruéis baseados no conceito “só os fortes sobrevivem”, observemos as condições em que a existência se descerra, não apenas no plano individual, mas também no contexto coletivo em seu aspecto social, cultural e econômico. São almas que, na absoluta situação de abandono social, psicológico e material, decidem por terminar a vida física em que a dor e o sofrimento atingem níveis insuportáveis. Nenhum espírito vem à experiência física para ser torturado a pretexto de ser fundamental à sua evolução. O suicídio não é a causa da falência moral do espírito, mas a consequência de uma sociedade na qual cada vez mais as forças econômicas trabalham para impedir que o existir seja a oportunidade de transformação do ser. Precisamos acolher nossos semelhantes e lutar a cada instante para que a Terra seja um lugar de desafio para o desenvolvimento do espírito e não para a sobrevivência e expansão das desigualdades criadas por sistemas humanos de expropriação das condições materiais da existência. Marcia Costa, espírita que um dia, diante de muita dor e sofrimento, quis cometer suicídio. Referêcias:

i 259. Do fato de pertencer ao espírito a escolha do gênero de provas que deva sofrer, seguir-se-á que todas as tribulações que experimentamos na vida nós as previmos e escolhemos?

Todas, não, porque não escolhestes e previstes tudo o que vos sucede no mundo, até às mínimas coisas. Escolhestes apenas o gênero das provações. As particularidades são a consequência da posição em que vos achais e, muitas vezes, das vossas próprias ações.”

ii 264. Que é o que dirige o espírito na escolha das provas que queira sofrer?

Ele escolhe, de acordo com a natureza de suas faltas, as que o levem à expiação destas e a progredir mais depressa. Uns, podem, portanto, impor a si mesmos uma vida de misérias e privações, objetivando suportá-las com coragem; outros preferem experimentar as tentações da riqueza e do poder, muito mais perigosas, pelos abusos e má aplicação a que podem dar lugar, bem como pelas paixões inferiores que uma e outro desenvolvem; outros, finalmente, se decidem a experimentar suas forças nas lutas que terão de sustentar em contato com o vício.”

iii Manejo Clínico das Repercussões do Racismo entre Mulheres que se “Tornaram Negras”. Disponível em https://www.scielo.br/j/pcp/a/PS556GX8mQ7CgwwzvbVgYts/abstract/?lang=pt.

iv Jovens negros são maioria em casos de suicídio no Brasil, disponível em https://www.cartacapital.com.br/sociedade/jovens-negros-sao-maioria-em-casos-de-suicidio-no-brasil/. Acesso em 16/9/2021.

v Suicídio da população LGBT: precisamos falar e escutar. Disponível em https://www.cartacapital.com.br/blogs/suicidio-da-populacao-lgbt-precisamos-falar-e-escutar. Acesso em 16/9/2021.

 

Repúdio à convocação aos atos pró-Bolsonaro em 7 de setembro por parte de alguns espíritas

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Há cinco anos o coletivo Espíritas à Esquerda trabalha no intuito de esclarecer, acolher e debater com a comunidade dos espíritas e não espíritas os diversos problemas que afligem a sociedade brasileira de maneira ampla e plural. Os últimos anos trouxeram grandes desafios ao movimento espírita brasileiro, impondo aos espíritas, incomodados e preocupados com a onda reacionária que tomou conta de diversos setores da sociedade brasileira, posicionarem-se de maneira mais ostensiva contra o fascismo que corrói as bases da frágil democracia brasileira. Desta forma, foi com tristeza, porém sem surpresa, que identificamos nas redes sociais diversas manifestações, por parte de autointitulados médiuns e supostos grupos espíritas, convocando os confrades para comparecerem aos atos antidemocráticos previstos para o próximo 7 de setembro. Dito isso, afirmamos:

1. Repudiamos o apoio a tais manifestações, que são fomentadas pelos setores historicamente mais reacionários e obscuros da política e da sociedade brasileiras. Não coadunamos com grupos que fazem uso da violência e da mentira como caminhos de edificação social.

2. Defendemos a liberdade de expressão nos moldes definidos pela Constituição Federal de 1988, e, desta forma, não entendemos como liberdade de expressão a ameaça, o achincalhamento e a agressão às instituições republicanas, bem como qualquer arroubo de ruptura institucional por meio da força.

3. Afirmamos que o espírita que se alinha ao atual governo federal, representado por criatura ignóbil e perversa, está profundamente enganado quanto aos preceitos do espiritismo moderno e, de maneira irresponsável e covarde, conduz desavisados ao caminho do erro.

4. Por fim, rechaçamos de maneira veemente qualquer tipo de defesa, por parte dos espíritas, dum presidente que em diversos momentos demonstrou desrespeito e indiferença às vítimas da pandemia que nos assola e que sistematicamente reproduz falas e atitudes vulgares, envergonhando nosso país e humilhando nosso povo, sobretudo os mais pobres.

Desta forma, chamamos os espíritas verdadeiramente preocupados com o Brasil, os espíritas realmente dedicados ao progresso, para não comparecerem aos atos golpistas prometidos para o próximo 7 de setembro.