

Por Elizabeth Hernandes
“Mas que isso não nos pareça humilhante, como se exigissem que em primeiro lugar tivéssemos interesses mais universais.” (Clarice Lispector in “Amor Imorredouro” na coletânea “Todas as Crônicas”, editora Rocco.
No lançamento do livro da minha amiga Ana Beatriz Cabral, que ocorreu na livraria de propriedade de outras amigas, encontrei a coletânea “Clarice Lispector – Todas as Crônicas”, prefaciada por outra mulher que admiro, Marina Colasanti. E é claro que me esqueci que preciso economizar e não devo gastar num livro de capa dura e que tenho vários outros na fila do “ler ainda nesta encarnação”. Esqueci de tudo, como qualquer adicto o faz, diante do prazer irresistível.
Tenho a sorte de ter mais vícios bons do que maus (pelo menos é o que acredito) e, em sendo assim, é óbvio que eu não vou entrar numa livraria de rua, com a curadoria zelosa de Camile e Ariana e sair apenas com o livro da Ana Beatriz. Este Clarice faz parte daquelas coisas e experiências que me deixam pensando que, se não as possuir, nunca mais serei feliz. Durmam com esta, minimalistas!
E como tenho sido feliz com esta Clarice, que me perdoe a Ana Beatriz, motivo da ida à livraria, e que também escreve primorosamente. Mas é a Clarice, né Bia?
E eu que não sou Clarice nem Ana, me divirto escrevendo sobre quem escreve pois cada um faz o que gosta com aquilo que pode.
Este livro de Clarice tá pra mim como a piada preconceituosa sobre o nordestino e a farinha de mandioca. Aliás, quem não reverenciar a mandioca, bom sujeito não é.
Comigo seria mais ou menos assim. “Beth, tu gosta de sexo?” “Ôxe, demais!” “E de crônicas?” “Ai, Jesus…” “ E de Clarice?” “Não para, não para!”. “E de crônicas escritas por Clarice?”. Sem resposta, só um suspiro e um gemido baixo.
Adoro crônicas, de escritores geniais e reconhecidos e também de escritores geniais e não reconhecidos.
E quando encontro reconhecidos como Machado ou Clarice, labutando nesse falso gênero ligeiro que, na verdade, demanda lenta construção e perene talento, me deleito. Nessa degustação do texto, a primeira coisa que faço é buscar apreender o espírito do tempo, dado que a crônica é um tipo de reportagem poética. E assim me transporto para o mundo de uma mulher intelectual, de classe média, na década de 1960, Ou para o de um escritor negro do século XIX, que as pessoas ( e talvez também o próprio) preferiam fingir que era branco. E depois me divirto (e mais ainda me entristeço), vendo a atualidade de textos escritos há meio século ou século e meio. E me admiro da coragem de quem se revela tanto porque, crônica, meu amigo, é como disse a própria Lispector: “E sinto-me um pouco como se estivesse vendendo minha alma. Falei nisso com um amigo que me respondeu: mas escrever é um pouco vender a alma. É verdade. Mesmo quando não é por dinheiro, a gente se expõe muito.”
Esse ”Todas as Crônicas” é daqueles livros onde a gente quer sublinhar quase todos os parágrafos ou copiar e postar nas redes sociais.
Quando se escrevem romances e contos, ainda há a desculpa de serem, oficialmente, classificados como ficção. Crônica, não. Até quando é inventada, exagerada, distorcida, é rigorosamente o retrato de um dia, uma cena, um acontecimento, na vida do escritor.
Eu, mesma, se cronista for, vos falo desde um domingo, aquele dia em que mulheres que têm boletos a vencer na segunda, encontram um espaço para escrever. E falo dos outros por estar num daqueles dias em que prefiro não contar nada de mim nem pra mim mesma mas, se comecei a escrever, vou acabar contando.
E assim, ao invés de ver minha tarde de domingo, vejo as tardes da branca Clarice expondo seus privilégios de classe e deixando claro que nem gosta muito do “politicamente correto” de sua época: “E ter empregadas, chamemo-las de uma vez de criadas, é uma ofensa à humanidade.” Clarice, amada, se você soubesse que hoje, nossos vizinhos aqui da Rua dos Remediados, onde eu e você moramos, referem-se a essas trabalhadoras como “secretárias do lar”… Como você não está aqui, mana, deixa que eu bato neles. E bato mesmo, viu?
Clarice expõe lindamente o seu machismo quando fala de Leopoldo Nachbin, seu amigo de infância: “Leopoldo – além de meu pai – foi o meu primeiro protetor masculino, e tão bem o fez que me deixou para o resto da vida aceitando e querendo a proteção masculina (…)”
E tem mais, uma parte que combina muito com esse meu domingo de hoje. Clarice expõe, crua e liricamente, as dores da mulher CIS heterossexual: “O homem. Como o homem é simpático. Ainda bem. O homem é nossa fonte de inspiração? É. O homem é nosso rival estimulante? É. O homem é nosso igual ao mesmo tempo inteiramente diferente? É. O homem é bonito? É. O homem é engraçado? É. O homem é um menino? É. O homem também é um pai? É. Nós brigamos com o homem? Brigamos. Nós não podemos passar sem o homem com quem brigamos? Não. Nós somos interessantes porque o homem gosta de mulher interessante? Somos. O homem é a pessoa com quem temos o diálogo mais importante? É. O homem é um chato? Também. Nós gostamos de ser chateadas pelo homem? Gostamos.”
Clarice, sua machista, eu te amo e nunca vou te deixar. As mulheres são as que ficam.
Gastão Cassel – EàE/SC
São frequentes os relatos de sessões mediúnicas, seja no kardecismo, na umbanda, no candomblé ou outras denominações, que têm presença importante de antigos escravizados (geralmente chamados de pretos velhos) e indígenas de diversos povos. E faz todo sentido que assim seja, pois cronologicamente foram os que nos antecederam, são o passado recente da história de nossas cidades, estados e país. Por incrível que pareça, tais espíritos muitas vezes são recebidos com preconceitos e estigmatizados como primitivos, culturalmente inferiores e até “selvagens”. O preconceito é decorrente da visão colonialista e elitista que pressupõem como “elevada” a cultura proveniente da Europa. Se nos despirmos do olhar colonialista, veremos que todos esses povos originários tinham rituais e práticas espirituais elevadas, relações estreitas com suas divindades e conjuntos de experiências culturais e éticas impressionantes. Mas o olhar colonial prefere ver a diferença como estranheza e primitivismo. Espaços como o Museu de Arte Pré-Colombiana, em Santiago, no Chile, são fartos em demonstrar que os povos nativos do continente tinham enorme produção cultural e práticas místicas e religiosas profundas e complexas, bem como sociedades com níveis de organização elevados. Povos que construíram, por exemplo, Machu Picchu, não podem ser considerados primitivos, a não ser pelo preconceito que vê virtude nos invasores que devastaram gentes e culturas em toda a América. Muitos desses povos desencarnados hoje dão sustentação espiritual a casas espíritas, são suportes indispensáveis à egrégora que conduz o trabalho de amparo à saúde. São espíritos comprometidos com o próximo, com o auxílio e a compaixão. São os povos originários que já foram maioria nessas terras e que trazem do plano espiritual muitos ensinamentos que revelam o quão evoluídos eram espiritualmente, não obstante seu sofrimento aqui na Terra, promovido pelos colonizadores que empunhavam armas e cruzes. Da mesma forma os escravizados representaram um enorme percentual da população que nos antecedeu. Essa população negra trouxe legados espirituais importantíssimos das culturas africanas, inclusive muçulmanas. Jamais renunciaram a suas práticas espirituais e culturais, mesmo que forçados a um sincretismo que, como disse a canção, é “tanto resistência como rendição”. O relacionamento com estes povos desencarnados exige de nós a compreensão da experiência terrena que tais povos tiveram. Na maior parte dos casos são histórias trágicas e violentas. A crueldade física e cultural a que foram submetidos os povos de origem africana escravizados no Brasil não pode ser relevada. Tão pouco os incontáveis massacres e dizimações de nações indígenas em toda a extensão do continente americano podem ser esquecidos. Os espíritos que hoje nos amparam viveram a crueldade na carne, e o mínimo que podemos e devemos fazer para respeitá-los e honrá-los é reconhecer a sua trajetória de dor e opressão. É verdade que espíritos não têm cor ou etnia, mas são constituídos e informados pelas suas experiências terrenas, pelo que aqui viveram, de forma que a lástima aqui sofrida os constitui de forma absoluta. Os chamados Pretos Velhos carregam ancestralidades africanas e práticas religiosas que precisavam ser escondidas no fundo das senzalas, ou manifestar-se abertamente nos quilombos libertários. Os indígenas foram – e ainda são – impiedosamente perseguidos e exterminados, algumas culturas completamente dizimadas. Tudo em nome da imposição de religiões e culturas tidas como “superiores” que se apresentavam em nome de Deus. Mais sagrado do que qualquer divindade é o direito que todas as pessoas têm de cultuar a sua. As práticas místicas dos povos originários são plenamente legítimas como todas as outras crenças não cristãs, como o budismo, o judaísmo, o islamismo, hinduísmo e tantas outras. O relacionamento com esta espiritualidade ancestral precisa partir do respeito aos que viveram aqui na Terra e agradecimento aos ensinamentos que podem nos oferecer em todas as dimensões. A celebração dessa espiritualidade ancestral precisa começar pelo reconhecimento de sua manifestação por meio dos povos originários remanescentes, pelo respeito à sua cultura, incluindo religiosidade e territórios. A espiritualidade indígena, além de resgatar traços históricos e culturais de sua sociedade, também nos remete à sua prática ritual que, através da rememoração dos mitos, fortalece a espiritualidade ancestral. Além do que, sua natureza telúrica aponta para um relacionamento profundo com a natureza e a preservação do Planeta. A prática do bem não é monopólio de nenhuma denominação religiosa, de nenhuma etnia, de nenhuma cultura, de nenhuma “civilização”. A prática da fraternidade, da solidariedade, da amorosidade, da compaixão são e devem ser universais. “Amai-vos uns aos outros” não faz nenhuma distinção. Há inúmeras palavras que significam Deus, com as mais diversas feições. “Sons diferentes para sonhos iguais”, disse um poeta. Homenagear a espiritualidade ancestral é defender aqui no presente os direitos dos povos originários que continuam sob ameaças colonizadoras incrementadas por interesses econômicos. É combater a herança maldita da escravidão, que se tornou o racismo estrutural de nossos dias. Os escravizados da América, os originários Yanomamis, Charruas, Quechuas, Incas, Mapuches, Guaranys, Teguelches, Tamoios, Tupis, Xoclengs e todos os povos originários da América estão em nós, entre nós e conosco. Saibamos honrá-los, respeitá-los e preservá-los.Em 2023, o EàE deve colocar como uma de suas prioridades de ação-reflexão a implantação de Núcleos Espíritas Populares (NEPs), que é uma proposta de renovação e transformação radicais para atuação do movimento espírita.
Como base introdutória para uma reflexão conjunta dos espíritas progressistas, o EàE participou do V Encontro Nacional da CEPABrasil, ocorrido em Santos, SP, entre os dias 4 e 6 de novembro de 2022, com o texto “Núcleos Espíritas Populares: uma proposta de renovação”, no qual esboça algumas premissas e propõe alguns caminhos para essa transformação do movimento espírita.
Esse texto completo foi apresentado virtualmente e está disponível no canal do YouTube do EàE, no seguinte endereço:
O texto completo para leitura pode ser baixado no seguinte endereço:
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Segue abaixo o resumo do texto:
“Esse discurso pretende apresentar uma proposta de renovação do movimento espírita e, mesmo que diminuta, da sociedade em que ele se insere. E esse propósito é buscado por meio do uso da beleza teatral do texto de Eurípedes, servindo ao mesmo tempo como forma, desenhando um cenário de fundo para a discussão, e como conteúdo reflexivo, pois a tragédia bacante conduz o seu leitor a uma paráfrase possível da realidade espírita por meio do drama vivido por suas personagens. Se Eurípedes, em sua maturidade encanecida e ao escrever sua última e impactante obra, foi capaz de refletir sobre os deuses gregos e questionar a religião, a condição social das mulheres e o poder do estado sobre a vida privada, é também possível que o movimento espírita brasileiro, após seus mais de cento e cinquenta anos, seja capaz de refletir sobre seu caminho, seus méritos, seus desvios e atalhos e propor saídas para os problemas que tem enfrentado na realidade em que atualmente se encontra. Com esse propósito e esse pano de fundo, parte-se das reflexões e práticas históricas de Paulo Freire e das Comunidades Eclesiais de Base para propor uma nova forma de atuação do movimento espírita, voltada para um trabalho popular de conscientização e de promoção da transformação social. Esse novo caminho é nomeado nesse discurso de Núcleo Espírita Popular (NEP). Não sendo mais possível pensar num movimento espírita que, por meio da atividade alienante e da caridade esmoler, contribui para manter os graves problemas sociais, contrariando tudo o que está proposto nos ensinos de Jesus e dos espíritos que auxiliaram Kardec, faz-se necessário ultrapassar esse estágio de fideísmo inócuo, focado exclusivamente na escatologia idealista e na soteriologia subjetiva, para avançar sobre a ideia central do Reino apresentada por Jesus quando se propôs a trazer para mulheres e homens a possibilidade da construção duma nova sociedade justa e fraterna, uma sociedade que não é desse mundo de opressão e indignidade. Para isso, faz-se também necessário pensar não apenas no objetivo principal, que é a continuidade da luta pela construção do Reino, mas refletir e propor caminhos objetivos para esse movimento ao mesmo tempo profundo e arriscado, haja vista a enorme resistência que será contraposta, como penteus contemporâneos, por todos os que se conservam em seus privilégios sociais, mormente dentro do próprio movimento espírita. Entretanto, essa é a tragédia a que está destinado o espiritismo, como um mensageiro de Dioniso, resgatar a originalidade revolucionária daquilo que foi trazido pelo homem nazareno, atuando como um educador das propostas dessa nova sociedade, conscientizando mulheres e homens do povo de seu papel histórico, social e político.”
Foi um ano difícil para todos. Isso é inegável. O país chega ao final desse ano com quase 700 mil mortos pelo vírus da pandemia e pelo verme genocida que se despede do poder. Muita dor, sofrimento, desespero e morte no caminho. Um caminho que já seria difícil sem o inominável no poder e que se tornou, por conta de sua imoralidade e inépcia, insuportável. Ou seja, um caminho que já seria difícil de qualquer maneira, por conta da pandemia, ficou insuportável por causa do miliciano.
Mas a parte do país que ainda consegue se indignar e lutar conseguiu, pela força da democracia, enxotar esse traste humano e tirar a quadrilha miliciana do poder.
E os espíritas progressistas tiveram importante papel nesse percurso, pois estiveram engajados continuamente na campanha eleitoral mais importante da história recente do Brasil, uma eleição que não foi apenas um embate de ideias e propostas, mas foi um embate entre amor e ódio, fraternidade e perversidade, cultura e ignorância, diversidade e discriminação, liberdade e autoritarismo, em suma, entre a civilização e a barbárie. E uma das formas de atuação foi o “Manifesto dos espíritas contra a reeleição do atual presidente”, proposto conjuntamente pelo EàE, ABPE e Ágora, que teve imensa adesão dos espíritas e grande repercussão na imprensa progressista. Além disso, a esquerda espírita esteve presente nas ruas durante todo o ano em manifestações e eventos de campanha contra a necropolítica do governo que se encerra. Os registros dessa intensa participação estão nas redes sociais do EàE.
E o EàE contribuiu nesse ano de 2022 com diversas edições de seus programas ao vivo nas redes sociais, trazendo personalidades e temas para o debate político, social e espírita. Esteve também presente com textos e reflexões sobre essas questões, buscando levá-las ao movimento espírita para que a realidade seja o principal tema de suas instituições, pois o EàE entende que não é possível pensar o espírito imortal sem a necessária reflexão sobre sua condição material de vida na Terra.
Nesse ano, o EàE conseguiu realizar, após a grave crise da pandemia de covid-19, o II Encontro Nacional da Esquerda Espírita. O encontro ocorreu na cidade de São Paulo, no dia 10 de julho, na sede do Sindicato dos Bancários de SP. No evento, que também foi transmitido ao vivo pelas redes sociais, estiveram presentes como palestrantes a Dora Incontri, o Thiago Torres, conhecido como Chavoso da USP, a deputada federal Luiza Erundina (PSOL-SP), e os professores Juliana Magalhães e Alysson Mascaro. Durante o encontro da esquerda espírita, ouvimos e debatemos sobre política, sociedade, espiritualidade e eleições.
Em 2022, o EàE, em parceria com a Associação Brasileira de Pedagogia Espírita (ABPE) e a Editora Comenius, lançou o Clube do Livro Espiritismo e Sociedade, com livros de autores espíritas progressistas que estavam ausentes das prateleiras das livrarias espíritas. Lançamos uma nova tradução de “Socialismos e espiritismo”, de Léon Denis; lançamos pioneiramente, após longos quase 70 anos, a obra “Os espiritualistas perante a paz e o marxismo”, de Eusínio Gaston Lavigne, cuja publicação de suas obras espíritas é exclusiva do EàE; publicamos também uma nova tradução de “Conceito espírita do socialismo”, de Cosme Mariño; e uma nova edição de “Dialética e metapsíquica”, de Humberto Mariotti. Ainda há novos livros espíritas progressistas a serem publicados dentro dessa coleção pioneira.
Em novembro, no Dia da Consciência Negra, o EàE lançou o primeiro livro de seu projeto antirracista: “O evangelho segundo o espiritismo – Edição antirracista”. Uma obra, gratuita, que veio romper o longo silêncio do movimento espírita sobre as questões étnicas e sobre o racismo presente nas obras kardecistas. Foi um projeto corajoso e abraçado por todos dentro do EàE, sendo conduzido com o cuidado necessário que a questão exige. Houve choro e ranger de dentes, mas houve também, em sua maioria, manifestações de apoio e de felicitações ao trabalho de enfrentamento do racismo feito pelo EàE dentro do movimento espírita.
Além de tudo isso, o EàE deu prosseguimento a seus grupos de estudos de espiritismo progressista e aprofundou suas reflexões sobre os Núcleos Espíritas Populares, uma proposta de transformação radical de atuação do movimento espírita.
O ano de 2023, que já surge cheio de esperança e alegria, será mais um ano de muito trabalho para o EàE. Há muitas novidades vindo por aí que vão, certamente, chacoalhar ainda mais o movimento espírita. Porque o EàE existe para isso.
Venha fazer parte desse movimento que agrega os espíritas progressistas e ajudar nas reflexões, nos projetos e na execução de suas propostas.
Gastão Cassel – Jornalista – EàE SC
É estrondoso o sucesso do podcast A Mulher da Casa Abandonada, criado pelo jornalista Francisco Felitti e produzido pela equipe Folha de São Paulo, disponível nos principais tocadores de podcast. A audiência já ultrapassou quatro milhões de ouvintes com uma média de audiência de 2 milhões de plays por episódio — números sem precedentes no cenário de podcasts do Brasil. Em comparação, programas desse formato, bem sucedidos, costumam ter audiência entre 60 mil e 80 mil pessoas. A Mulher da Casa Abandonada é a recuperação da história de um crime de grande repercussão há cerca de 20 anos, quando o casal Margarida e Renê Bonetti, foram acusados e processados nos Estados Unidos por manter uma funcionária doméstica brasileira, negra, em condições análogas à escravidão. A produção se desenvolve a partir do momento que o autor fica sabendo que a mulher misteriosa que mora sozinha num casarão abandonado no bairro mais caro de São Paulo é a criminosa que foi foragida do FBI. O grande sucesso do podcast se sustenta sobre três pilares bem claros: o jornalismo, a literatura e a exploração dos recursos de áudio. O autor combina os três elementos com grande maestria, gerando interesse, curiosidade e muito prazer em ouvir. Todos os elementos se encaixam com perfeição gerando um produto que, sem perder seu caráter informativo e de denúncia social, ganha contornos lúdicos. Ouve-se o podcast como quem ouve uma novela, uma história ou um romance.Feminismos com Susete Campos
Relato de Susete Campos, que acompanha o Coletivo Espíritas à Esquerda desde o I Encontro Nacional em 2019, em Salvador “Em tempos de tempestades Diversas adversidades Eu me equilibro e requebro É que eu sou tal qual a vara Bamba de bambu-taquara Eu envergo mas não quebro” (Lenine) Lá em 2019, quando aconteceu o primeiro encontro dos EàE, imaginávamos que esses anos seguintes seriam difíceis, mas foram piores que o anúncio do pesadelo. Tudo que já foi um dia, deixou de sê-lo. Veio a pandemia –solidão, doença e morte. Despedidas e enterros. A perversidade travestida de governo nos horrorizou diariamente com absurdos, violências, desrespeitos, malfeitos, malandragens, crueldades. Não houve um dia sequer em que o mal não se descortinasse à nossa frente e sem que nos perguntássemos até quando. Mas como não há mal que se imponha para sempre, resistimos. Tivemos importantes vitórias na justiça. A operação lava-jato, agora conhecida como farsa-jato, ruiu junto com seus heróis fajutos. Estamos nos preparando para um novo tempo de esperança. Envergamos, mas não quebramos. Paralelamente, o movimento de espíritas progressistas floresceu. Com a criação de vários coletivos, foi produzida uma vasta lista de materiais de estudo no formato de lives, reuniões online, publicação de novos livros. Foi como uma onda resgatando companheiros e companheiras de ideais, pessoas desiludidas com o que se transformou as casas espíritas sob a égide da FEB. Envergamos, mas não quebramos. Em agosto de 2020, o grupo EàE-DF criou o grupo de estudo Léon Denis com reuniões quinzenais. O primeiro tema estudado foi a Teologia da Libertação (Leonardo Boff e Frei Betto) com foco na metodologia de ensino de Paulo Freire e nas Comunidades Eclesiais de Base (CEB). Passamos pela obra de Léon Denis, Socialismo e espiritismo, e atualmente estamos estudando a obra de Herculano Pires, O Reino. Fazer parte dos grupos de WhatsApp desse pessoal, ler e discutir, em reuniões quinzenais, também tem sido uma forma de resistir. Mas queremos mais. Inspirados por Paulo Freire, é preciso esperançar, agindo. Queremos levar adiante nossos projetos, junto com todos e todas que se somam e sonham com um mundo mais justo e fraterno, o Reino anunciado por Jesus. Envergamos, mas não quebramos. Com adiamento de mais de dois anos por conta da pandemia, finalmente em 10 de julho, em São Paulo, aconteceu o II Encontro Nacional da Esquerda Espírita, com os seguintes temas para reflexão e debate “Política e eleições” e “Conjuntura política brasileira”. Calor humano, reflexão, escuta ativa, assim foi nosso dia. O objetivo desse texto é fazer um registro do conteúdo das palestras, para que essas falas possam trazer conhecimento, reflexão e inspiração para agir.